sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O QUE FAZER EM CASOS DE VIOLAÇÃO DE DIREITOS E MAUS TRATOS CONTRA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA?


O imortal escritor e dramaturgo George Bernard Shaw (1856 – 1950) proclamou em sua máxima que “o pior pecado contra nosso semelhante não é o de odiá-los, mas de ser indiferentes para com eles”.

Ele tem razão. Existem pessoas que além de odiar o outro pela sua diferença – posicionamento político e/ou religioso, condição sexual e/ou econômica, etnia, idade ou condição física – são indiferentes quando a diferença necessita de, no mínimo, respeito.

Exemplifico. Aconteceu hoje (20 de janeiro de 2011) na cidade de São José dos Campos uma briga entre um delegado e um cadeirante, por um estacionamento em uma vaga pública reservada para pessoas com deficiência.

Conforme a imprensa, o cadeirante Anatole Magalhães Macedo Morandini, advogado, 35 anos, ao flagrar o delegado Damasio Marino estacionado na vaga especial, em frente a um cartório na região central do município, foi tomar satisfação e se tornou vítima numa briga, digamos, esdrúxula.

"Ele [delegado] me chamou de aleijado filho da puta. Eu fiquei enojado, e a única coisa que consegui fazer foi cuspir no carro dele, porque me senti desrespeitado.".

Ainda segundo Morandini, o delegado do 6º Distrito Policial da cidade, além de lhe dar coronhadas, também bateu em seu rosto com a ponta da arma.

"Ele apontou a arma, fez mira. A única coisa que eu fiz foi virar o rosto devido ao trauma que já tenho", contou o advogado, referindo-se ao tiro que levou durante um assalto, aos 17 anos, e que o deixou paraplégico.

O advogado do delegado Marino afirma que seu cliente deu "dois tapas" em Morandini, mas só depois de ser xingado e receber uma cusparada. Para Silva, "esse cadeirante procurou o confronto.". O advogado também negou que Damasio tenha xingado Morandini ao ser repreendido. Segundo Silva, o delegado reagiu após Morandini cuspir em sua cara.

"Ele [delegado] não entendeu o que estava acontecendo. Desceu do carro e o cara veio com a cadeira de rodas para cima dele. [Morandini] cuspiu de novo e o xingou, então ele [delegado] pegou e deu dois tapas no cara."

No fim da tarde, foi noticiado que a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo afastou o delegado de suas funções para que sejam realizadas apurações da responsabilidade funcional por meio da instauração de um procedimento administrativo. A investigação soma-se
ao inquérito já aberto para apurar a suspeita de lesão corporal dolosa, quando há intenção ou se assume o risco de cometer o crime.

Posta a informação, vamos às minhas considerações:

a) Tenho a plena convicção de que não é por uma pessoa ser deficiente que ela tenha direito à regalias, caso cometa algum ato infrator, nem que utilize de sua condição para obter vantagens. Porém, pelo que foi noticiado, este não é o caso em tela.

b) O cadeirante foi cobrar da pessoa que estava estacionado – e poderia ser um professor, médico, político, pedreiro, contador, ou seja, de qualquer profissional que estivesse lá – que saísse da vaga reservada para pessoas que se encontram em sua situação.

c) A vaga é uma garantia legal contemplada pela Resolução n° 304 de 18 de dezembro de 2008 do CONTRAN – Conselho Nacional de Transito, que regulamenta “as vagas de estacionamento destinadas exclusivamente a veículos que transportem pessoas portadoras de deficiência e com dificuldade de locomoção.” 

d) Tratava-se, portanto, de um direito que foi solicitado. Ao ouvir a sentença pejorativa: “aleijado filho da puta”, perdeu o controle, e imobilizado em razão de sua situação, cuspiu no carro do agressor, como forma de manifestação. A utilização de arma e até a realização de sangramento no deficiente precisa ser apurada pelas autoridades, principalmente por meio de testemunhas ou filmagens, caso existam na região.

e) É necessário que sejam apuradas as responsabilidades do delegado, pois a possível utilização da sua posição profissional, pode configurar o crime administrativo de abuso de poder, uma vez que, utilizando-se de uma prerrogativa legal que lhe foi concedida, utilizou-se de sua posição para a defesa de interesses não públicos.

f) Um delegado como qualquer outra AUTORIDADE PÚBLICA, deveria pensar duas vezes antes de fazê-lo. Impossível acreditar que o mesmo não processou mentalmente sua ilegalidade ao estacionar na vaga especifica.

g) Impossível acreditar que o mesmo não sentiu, no mínimo, vergonha na cara, ao ser cobrado pelo cadeirante, que saísse de sua vaga.

h) Triste é ver uma AUTORIDADE PÚBLICA achar que é superior aos demais e em razão disto, reagir como o fez. Aleijada é a mentalidade deste sujeito que se diz delegado. Ela é atrofiada em meio ao que está no lugar onde deveriam estar o conhecimento jurídico e humano que precisaria já ter adquirido para chegar onde está, enquanto agente público.

Enfim, e não pecando pela generalização, é triste constatar que muitas pessoas não estão preparadas para ter o poder a sua disposição. Confundem a finalidade PÚBLICA do deter o poder, para a obtenção de outros fins que não aquela.

Sábio é o conhecimento popular: “Quer conhecer alguém, lhe dê o poder!"

Espero que este delegado aprenda a respeitar seu próximo. Aprenda a além de guardar seu ódio incumbido por “aleijados”, a respeitar a condição do outro.

Se não for pelo “o outro” puramente, que seja pelo menos em respeito a sua categoria. Deprimente saber que ainda existem pessoas assim.



Aproveito para informar às pessoas com deficiência que são vítimas de violações de direitos ou de maus tratos que procurem por um desses serviços que podem lhe auxiliar:

a) Policia Militar pelo telefone 191. Preste queixa. Registre os fatos.

b) Disque Direitos Humanos pelo telefone 181. Denuncie casos de violações de direitos e/ou de maus tratos contra pessoas com deficiência. A denúncia pode ser anônima e será devidamente investigada.

c) Delegacia da Policia Civil ou, caso exista em sua cidade, a Delegacia Especializada ao Atendimento de Pessoas com Deficiência e Idosos (normalmente atuam especificamente para ambos os públicos). Procure conhecer a organização da Policia Civil de sua cidade e como auxiliar em casos de violações de direitos e de maus tratos.

d) O CREAS – Centro de Referência Especializado em Assistência Social de seu município. Se não houver o serviço de recebimento de denúncias de maus tratos contra deficientes, encaminhará para o órgão responsável pelo serviço. Se você não souber onde fica a(s) unidade(s) do CREAS de seu município, procure pelo CRAS – Centro de Referencia em Assistência Social, no seu bairro ou no mais próximo de sua residência. Nos CRAS, profissionais chamados Assistentes Sociais poderão lhe orientar melhor.

e) Procure pela Secretaria, Gerência, Coordenadoria ou Departamento de Apoio à Pessoas com Deficiência. Independentemente da estrutura/nome que apresente, este é o órgão responsável por políticas públicas para pessoas com deficiência do seu município. Caso exista, pode auxiliá-lo com serviços desde a orientação de direitos até encaminhamento para a rede de atendimento, com apoio psicológico, jurídico ou com outras finalidades. Informe-se em seu município sobre a existência deste órgão.

f) Caso a violação de direitos ou maus tratos tenha ocorrido em algum órgão público, você pode procurar pelo serviço de Ouvidoria do Município, do Estado ou da União, dependendo da hierarquia do órgão onde ocorrera a violação de direito ou maus tratos. Você tem direito a receber a informação do servidor público que cometeu essa violação ou que lhe maltratou. Junte esta confirmação com os dados do órgão onde os fatos ocorreram.


Manifeste-se. Isto vai além de DENUNCIAR. Trata-se de um DIREITO. É o respeito a você e à cidadania de todas as pessoas com deficiência.

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